quarta-feira, 20 de novembro de 2024

Dia Mundial dos Pobres: diocese de Caxias do Sul ajuda mais de mil gaúchos



As ações pelo Dia Mundial dos Pobres, celebrado no domingo (17/11), foram realizadas numa parceria da Cáritas Diocesana com as paróquias e Pastorais da Caridade. Entre as iniciativas que beneficiaram 1,3 mil pessoas: almoços comunitários, brechó, bazar solidário e atividades com as pessoas em situação de rua em Caxias do Sul.

Felipe Michelon Padilha - Diocese de Caxias do Sul/RS

"Tudo isto requer um coração humilde, que tenha a coragem de se tornar mendigo. Um coração pronto a reconhecer-se pobre e necessitado. Existe, efetivamente, uma correspondência entre pobreza, humildade e confiança", escreveu o Papa Francisco em sua mensagem para a VIII Jornada Mundial dos Pobres, celebrada no domingo, 17 de novembro. O Santo Padre, a partir do tema: "A oração do pobre eleva-se até Deus" (cf. Sir 21,5), convidou a "fazer nossa a oração dos pobres e rezar com eles".

Diante da mensagem do Papa, a Diocese de Caxias do Sul fez um belo exercício por meio da Cáritas Diocesana, o braço da caridade da Igreja que está dando belos passos após a sua reestruturação na. A primeira ação: convidar paróquias e pastorais que quisessem construir juntas ações para marcar a data como sinal da caridade organizada na Igreja Particular de Caxias do Sul. E assim aconteceu: o planejamento, a organização de parcerias e a realização das ações que alcançaram 1,3 mil pessoas nos dias 16 e 17 de novembro.

Diz o Papa em sua mensagem para a VIII Jornada Mundial dos Pobres: "é uma oportunidade pastoral que não deve ser subestimada, porque desafia cada fiel a escutar a oração dos pobres, tomando consciência da sua presença e das suas necessidades. É uma ocasião propícia para realizar iniciativas que ajudem concretamente os pobres, e também para reconhecer e apoiar os numerosos voluntários que se dedicam com paixão aos mais necessitados".

Na Diocese, as iniciativas ganharam o nome de "Dia da Solidariedade". Uma delas aconteceu na Paróquia Santíssima Trindade, rede de comunidades que abraça a periferia da zona Oeste da cidade de Caxias do Sul. A comunidade Nossa Senhora Aparecida, do loteamento Vale Verde foi o local que recebeu a ação da VIII Jornada Mundial dos Pobres. Mais de 120 pessoas participaram de uma manhã cheia de atividades: tudo começou com o café. As crianças participaram do "jogo do cavalinho", tradicional na região, e ganharam brinquedos na premiação, além das pinturas com características dos super-heróis. Os adultos participaram do bingo solidário e do rifão beneficente e receberam brindes, frutos de doação de pessoas e empresas.

Pe. Leonardo, coordenador de Pastoral, servindo no Dia da Solidariedade no Vale Verde
Pe. Leonardo, coordenador de Pastoral, servindo no Dia da Solidariedade no Vale Verde

Antes do almoço, o vigário geral e coordenador de Pastoral da Diocese de Caxias do Sul, padre Leonardo Inácio Pereira, e o pároco local, padre Moacir Pauletti, realizaram um momento de espiritualidade, também conduzido pela irmã Cecília Berno, da congregação das irmãs de São José. Logo depois, um delicioso almoço foi servido e os garçons eram os padres, as irmãs, o membro da Escola Diaconal São Filipe, Jeferson Pinto Pereira e sua família, e pessoas que se dedicam na comunidade.

A Igreja Católica marca sua presença junto às comunidades da Paróquia Santíssima Trindade. Durante o período das enchentes, maior catástrofe ambiental da história do Rio Grande do Sul, em maio de 2024, os bairros atendidos foram bastante atingidos por estarem localizados numa encosta e receberem as águas de um córrego da cidade. Dentre os participantes dessa ação, um casal Rogério Oliveira Machado e Keli Barbosa Lemos deram testemunho da missão eclesial no meio das famílias atingidas: "Em 13 anos, que eu moro ali, ela já mora há 30 e poucos anos, foi a primeira vez que aconteceu. Entrou um palmo e pouco de água embaixo do porão, apodreceu todos os pilares, e a Igreja que ajudou a gente. Deu cimento, argamassa, para fazer novo reboco e para a gente fazer os pilares novos".

O casal foi uma das tantas ajudas que foram destinadas do fundo diocesano que arrecadou mais de R$ 1 milhão via doações por PIX vindas de diversas partes do Brasil. A coordenação de Pastoral e a coordenação da Cáritas constituíram um grupo de trabalho responsável por deliberar pelo encaminhamento dos recursos mediante apresentação de um relatório feito pelas paróquias acerca da realidade das famílias que foram atingidas em cada localidade.

Da necessidade à abertura de coração: caminho de solidariedade

Durante as enchentes, Rogério, que é reciclador perdeu máquinas elétricas, como a serra de disco e a furadeira, utilizadas por ele para o trabalho. Hoje, ele está trabalhando mais horas e também aos finais de semana para compensar o tempo que não pôde ir para a rua buscar materiais. "Pra não ficar parado, a gente preferiu ajudar as pessoas. Eu tenho um caminhãozinho e forneci para alguns bairros. Eu emprestei o caminhão para buscar móveis, para o pessoal que foi atingido, cestas básicas, roupas. Levei uma carga de leite, cobertas, acho que tinham umas 80 cestas básicas. Nós fomos ajudar. A gente se pôs no lugar de muita gente. Nós fomos uma das famílias que fomos atingidos, mas não tanto como outras pessoas", ressaltou.

Os irmãos Liziane, André e Maria Aparecida Garcia Coimbra ajudaram no Dia da Solidariedade. Durante as enchentes, a família teve parte do telhado da casa arrancado pelos ventos fortes. Visitado pelas irmãs Cleonice e Cecília, o núcleo familiar também recebeu ajuda do fundo diocesano para o cuidado com as pessoas atingidas pelas enchentes. Eles fazem parte do pequeno grupo de jovens da Paróquia e puderam colaborar com a realização da VIII Jornada dos Pobres. "É muito gratificante para a gente estar aqui ajudando nessa festa, porque a gente também foi ajudado pela Diocese, pela Igreja, e a gente se sente muito feliz em ajudar, fazer parte desse movimento e ajudar os outros também que precisam", salientou Liziane.

Bazar Solidário da Cáritas
Bazar Solidário da Cáritas

Ações mobilizaram brechós, bazar solidário e atividade com pessoas em situação de rua

Foram quatro os locais da cidade de Caxias do Sul que tiveram ações do Dia da Solidariedade. Além da comunidade do Vale Verde, que teve atividades no sábado, as paróquias Santos Apóstolos, Cristo Operário e Nossa Senhora de Lourdes organizaram momentos da VIII Jornada Mundial dos Pobres no domingo, dia 17. Todas as ações foram visitadas pela secretária executiva da Cáritas, Loiva Menezes, e pelo coordenador de Pastoral, padre Leonardo Inácio Pereira, além da assessoria de comunicação da Diocese.

Ainda no sábado, 16 de novembro, a Cáritas Diocesana realizou a primeira edição do Bazar Solidário Cáritas, com a participação de 70 pessoas que adquiriram roupas e acessórios do vestuário e puderam colaborar com o trabalho de solidariedade da Cáritas.

No domingo, dia 17, a Paróquia Santos Apóstolos preparou 150 kits com risoto, frango e pão para as mais de 130 famílias atendidas pela Pastoral do Pão no bairro Vila Lobos/Vergueiros e nos loteamentos Conquista e Boa Vista. O pároco, padre Mateus Boldori e o seminarista Leonardo Velho Soares acompanharam as entregas das marmitas e conduziram momentos de oração e espiritualidade.

A secretária executiva da Cáritas Diocesana, Loiva Menezes, avaliou positivamente as ações neste primeiro ano em que a VIII Jornada Mundial dos Pobres, na Diocese, teve ações sistemáticas e organizadas. "Há muito ainda por ser feito, mas começamos dando passos. E tudo isso só foi possível porque muita gente aceitou o desafio e colocou a mão na massa. Deu de si, do seu tempo, doou comida, materiais, etc. E assim, unidos, vamos seguir para planejar mais ações em 2025".

Na Paróquia Cristo Operário, a ação preparada pela Pastoral da Caridade que reuniu cerca de 100 pessoas foi realizada na manhã do dia 17 de novembro, na comunidade Menino Jesus de Praga, no bairro Bela Vista. Ao longo da atividade, as famílias tiveram aula de ginástica, manicure, psicóloga à disposição para uma escuta ativa, além de momentos de música e espiritualidade, que antecederam o almoço. A iniciativa contou com a presença dos padres da paróquia: Jaime e Jairo Gusberti.

Realizada mensalmente, mas neste mês de novembro antecipada do último domingo para a VIII Jornada Mundial dos Pobres, a ação da Pastoral das Pessoas em Situação de Rua da Diocese de Caxias do Sul foi realizada no salão da Paróquia Nossa Senhora de Lourdes. Foram oferecidos o café da manhã e o almoço, que foi à base de arroz e moqueca. Ao longo da manhã, a ONG Médicos do Mundo ofereceu atendimento de saúde, além da podologia vinculada à Universidade de Caxias do Sul. No momento de oração, padre Leonardo Inácio Pereira recordou que todo o ser humano é pobre, mas que Deus dá dons e a capacidade de servir e ajudar os irmãos. Fez isso ao recordar o avental do serviço de cada voluntário, relacionando que a estola que portava para dar a bênção é o avental do serviço do padre.

Para o bispo diocesano de Caxias do Sul, Dom José Gislon, as ações da Cáritas foram muito importantes para mostrar à comunidade, ou mobilizar a comunidade para agir e expressar também no seu jeito de ser e de viver o Evangelho presente na realidade dos outros, em comunhão com os pobres. "Creio que todas essas ações, quando nós fazemos à luz da Palavra de Deus, em nome da fé que professamos, não são pesadas, mas, acima de tudo, nos dão a força de vivermos a nossa fé e de sermos instrumentos de Deus no mundo, na realidade de hoje.  Agradeço a todos e a todas que se envolveram nesta grande corrente de solidariedade, de gestos fraternos, que marcaram a VIII Jornada Mundial dos Pobres, e que continuem marcando também a ação solidária e caritativa em toda a caminhada da nossa Igreja diocesana", concluiu.

Coleta de alimentos não perecíveis na Região Pastoral de Bento e no Vicariato de Nova Prata

A VIII Jornada Mundial dos Pobres também foi celebrada em outras partes da Diocese de Caxias do Sul. Na Região Pastoral de Bento Gonçalves está acontecendo uma campanha de doação de alimentos não perecíveis em todas as paróquias de Bento Gonçalves, Monte Belo do Sul, Pinto Bandeira, Santa Tereza e do distrito de Santa Bárbara, que pertence ao município de São Valentim do Sul. A iniciativa acontece entre os dias 16 e 24 de novembro. As doações serão destinadas aos serviços de caridade das paróquias da Região Pastoral de Bento Gonçalves.

No Vicariato de Nova Prata, a ação que contemplou as 14 paróquias da região também foi a coleta de alimentos. Nos dias 16 e 17 de novembro, os fiéis foram convidados a fazer suas doações nas celebrações. As doações serão destinadas aos serviços de caridade das paróquias do Vicariato de Nova Prata e outras realidades necessitadas.

 

Sinodalidade, uma conversão para sermos mais missionários




 O Documento Final da segunda sessão da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo, aprovado integralmente pela assembleia, relata e impulsiona uma experiência de Igreja pautada na “comunhão, participação e missão”, com a proposta concreta de uma nova visão que subverte práticas consolidadas.

Giampaolo Mattei

O Documento Final votado hoje, aprovado em todos os seus 155 parágrafos, está publicado e não será objeto de uma exortação do Papa: Francisco decidiu que seja imediatamente divulgado para que possa inspirar a vida da Igreja. “O processo sinodal não se encerra com o término da assembleia, mas inclui a fase de implementação” (9). Envolvendo todos no “caminho cotidiano com uma metodologia sinodal de consulta e discernimento, identificando modos concretos e percursos formativos para realizar uma tangível conversão sinodal nas várias realidades eclesiais” (9). No Documento, em particular, é solicitado aos bispos um compromisso intenso em relação à transparência e à prestação de contas, enquanto — como também declarou o cardeal Férnandez, prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé — estão em andamento trabalhos para dar mais espaço e poder às mulheres.

Duas palavras-chave emergem do texto — permeado pela perspectiva e pela proposta de conversão —: “relações” — que é uma maneira de ser Igreja — e “vínculos”, no sentido de um “intercâmbio de dons” entre as Igrejas, vivido de forma dinâmica e, assim, para converter os processos. Justamente as Igrejas locais estão no centro do horizonte missionário, que é o próprio fundamento da experiência de pluralidade da sinodalidade, com todas as estruturas a serviço, em suma, da missão, com o laicato cada vez mais ao centro e protagonista. E, nessa perspectiva, a concretude de estar enraizados em um “lugar” emerge com força no Documento Final. Também é particularmente significativa a proposta apresentada no Documento para que os Dicastérios da Santa Sé possam iniciar uma consulta “antes de publicar documentos normativos importantes” (135).

A estrutura do Documento

O Documento Final é composto por cinco partes (11). A primeira, intitulada: O coração da sinodalidade, é seguida pela segunda parte — Juntos, na barca de Pedro — “dedicada à conversão das relações que edificam a comunidade cristã e dão forma à missão na intersecção de vocações, carismas e ministérios”. A terceira parte — Sobre a tua Palavra — “identifica três práticas intimamente interligadas: discernimento eclesial, processos decisórios, cultura da transparência, da prestação de contas e da avaliação”. A quarta parte — Uma pesca abundante — “delineia a forma como é possível cultivar, de maneira nova, o intercâmbio de dons e o entrelaçamento de vínculos que nos unem na Igreja, em um tempo em que a experiência de enraizamento em um lugar está mudando profundamente”. Finalmente, a quinta parte — Também eu vos envio — “permite olhar para o primeiro passo a ser dado: promover a formação de todos para a sinodalidade missionária”. Em particular, observa-se que o desenvolvimento do Documento é guiado pelos relatos evangélicos da Ressurreição (12).

As feridas do Ressuscitado continuam a sangrar

A Introdução do Documento (1-12) esclarece desde o início a essência do Sínodo como uma “experiência renovada daquele encontro com o Ressuscitado que os discípulos viveram no Cenáculo na noite de Páscoa” (1). “Contemplando o Ressuscitado” — afirma o Documento — “vislumbramos também os sinais de Suas feridas (…) que continuam a sangrar no corpo de muitos irmãos e irmãs, inclusive devido a nossas próprias falhas. O olhar voltado ao Senhor não nos afasta dos dramas da história, mas nos abre os olhos para reconhecer o sofrimento que nos rodeia e nos penetra: os rostos das crianças aterrorizadas pela guerra, o choro das mães, os sonhos desfeitos de tantos jovens, os refugiados que enfrentam jornadas terríveis, as vítimas das mudanças climáticas e das injustiças sociais” (2). O Sínodo, ao lembrar as “muitas guerras” em curso, uniu-se aos “repetidos apelos do Papa Francisco pela paz, condenando a lógica da violência, do ódio, da vingança” (2). Além disso, o caminho sinodal é marcadamente ecumênico — “orienta-se para uma unidade plena e visível dos cristãos” (4) — e “constitui um verdadeiro ato de recepção adicional” do Concílio Vaticano II, prolongando sua “inspiração” e renovando “para o mundo de hoje a sua força profética” (5). Nem tudo foi fácil, reconhece o Documento: “Não escondemos que experimentamos em nós dificuldades, resistências à mudança e a tentação de fazer prevalecer nossas próprias ideias sobre a escuta da Palavra de Deus e a prática do discernimento” (6).

O coração da sinodalidade

A primeira parte do Documento (13-48) se abre com reflexões compartilhadas sobre a “Igreja Povo de Deus, sacramento de unidade” (15-20) e sobre as “raízes sacramentais do Povo de Deus” (21-27). É um fato que, justamente “graças à experiência dos últimos anos”, o significado dos termos “sinodalidade” e “sinodal” tenha “sido mais bem compreendido e, ainda mais, vivido” (28). E “cada vez mais, esses termos têm sido associados ao desejo de uma Igreja mais próxima das pessoas e mais relacional, que seja casa e família de Deus” (28). “Em termos simples e sintéticos, pode-se dizer que a sinodalidade é um caminho de renovação espiritual e de reforma estrutural para tornar a Igreja mais participativa e missionária, para torná-la, assim, mais capaz de caminhar com cada homem e mulher, irradiando a luz de Cristo” (28). Na consciência de que a unidade da Igreja não é uniformidade, “a valorização dos contextos, das culturas e das diversidades, e das relações entre eles, é uma chave para crescer como Igreja sinodal missionária” (40). Com o fortalecimento das relações também com as demais tradições religiosas, em particular “para construir um mundo melhor” e em paz (41).

A conversão das relações

“A necessidade de uma Igreja mais capaz de nutrir as relações: com o Senhor, entre homens e mulheres, nas famílias, nas comunidades, entre todos os cristãos, entre grupos sociais, entre religiões, com a criação” (50) é a constatação que abre a segunda parte do Documento (49-77). E “não faltou também quem compartilhou o sofrimento de se sentir excluído ou julgado” (50). “Para ser uma Igreja sinodal, é necessária, portanto, uma verdadeira conversão relacional. Devemos aprender novamente com o Evangelho que o cuidado com as relações e os vínculos não é uma estratégia ou instrumento para uma maior eficácia organizacional, mas é o modo como Deus Pai se revelou em Jesus e no Espírito” (50). As “recorrentes expressões de dor e sofrimento por parte de mulheres de todas as regiões e continentes, sejam leigas ou consagradas, durante o processo sinodal, revelam o quanto frequentemente falhamos em fazer isso” (52). Em particular, “o chamado à renovação das relações no Senhor Jesus ressoa na pluralidade de contextos” ligados “ao pluralismo das culturas”, com, às vezes, “sinais de lógicas relacionais distorcidas e até mesmo opostas às do Evangelho” (53). O ponto é direto: “Nessa dinâmica encontram-se as raízes dos males que afligem nosso mundo” (54), mas “o fechamento mais radical e dramático é aquele em relação à própria vida humana, que leva ao descarte de crianças, ainda no ventre materno, e dos idosos” (54).

Ministérios para a missão

“Carismas, vocação e ministérios para a missão” (57-67) estão no centro do Documento, que visa à participação mais ampla de leigas e leigos. O ministério ordenado é “a serviço da harmonia” (68) e, em especial, “o ministério do bispo” é “unir em unidade os dons do Espírito” (69-71). Entre diversas questões, foi constatado que “a relação constitutiva do Bispo com a Igreja local não parece hoje suficientemente clara no caso dos Bispos titulares, como os Representantes pontifícios e aqueles que servem na Cúria Romana”. Junto com o bispo estão “presbíteros e diáconos” (72-73), para uma “colaboração entre os ministros ordenados na Igreja sinodal” (74). É significativa, ainda, a experiência da “espiritualidade sinodal” (43-48), com a certeza de que “se faltar a profundidade espiritual pessoal e comunitária, a sinodalidade se reduz a um expediente organizacional” (44). Por isso, destaca-se, “praticado com humildade, o estilo sinodal pode tornar a Igreja uma voz profética no mundo de hoje” (47).

A conversão dos processos

Na terceira parte do Documento (79-108), é imediatamente destacado que “na oração e no diálogo fraterno, reconhecemos que o discernimento eclesial, o cuidado dos processos decisórios e o compromisso de prestar contas de nossas ações e de avaliar os resultados das decisões tomadas são práticas com as quais respondemos à Palavra que nos indica os caminhos da missão” (79). Em particular, “essas três práticas estão intimamente interligadas. Os processos decisórios necessitam do discernimento eclesial, que requer escuta em um clima de confiança, que a transparência e a prestação de contas sustentam. A confiança deve ser mútua: aqueles que tomam as decisões precisam poder confiar e ouvir o Povo de Deus, que, por sua vez, necessita poder confiar em quem exerce a autoridade” (80). “O discernimento eclesial para a missão” (81-86), na verdade, “não é uma técnica organizativa, mas uma prática espiritual a ser vivida na fé” e “nunca é a afirmação de um ponto de vista pessoal ou de grupo, nem se resolve na simples soma de opiniões individuais” (82). “A articulação dos processos decisórios” (87-94), “transparência, prestação de contas, avaliação” (95-102), “sinodalidade e organismos de participação” (103-108) são pontos centrais das propostas contidas no Documento, surgidas da experiência do Sínodo.  

A conversão dos laços

“Em um tempo em que muda a experiência dos lugares onde a Igreja está enraizada e peregrina, é necessário cultivar de novas formas a troca de dons e a interligação dos laços que nos unem, sustentados pelo ministério dos Bispos em comunhão entre si e com o Bispo de Roma”: esta é a essência da quarta parte do Documento (109-139). A expressão “enraizados e peregrinos” (110-119) recorda que “a Igreja não pode ser compreendida sem o enraizamento em um território concreto, em um espaço e em um tempo onde se forma uma experiência compartilhada de encontro com Deus que salva” (110). Também com uma atenção aos fenômenos da “mobilidade humana” (112) e da “cultura digital” (113). Nessa perspectiva, “caminhar juntos nos diferentes lugares como discípulos de Jesus na diversidade dos carismas e dos ministérios, assim como na troca de dons entre as Igrejas, é um sinal eficaz da presença do amor e da misericórdia de Deus em Cristo” (120). “O horizonte da comunhão na troca de dons é o critério inspirador das relações entre as Igrejas” (124). Daqui surgem os “laços pela unidade: Conferências episcopais e Assembleias eclesiais” (124-129). Particularmente significativa é a reflexão sinodal sobre “o serviço do bispo de Roma” (130-139). Justamente no estilo da colaboração e da escuta, “antes de publicar documentos normativos importantes, os Dicastérios são exortados a iniciar uma consulta das Conferências episcopais e dos organismos correspondentes das Igrejas Orientais Católicas” (135).  

Formar um povo de discípulos missionários

“Para que o santo Povo de Deus possa testemunhar a todos a alegria do Evangelho, crescendo na prática da sinodalidade, necessita de uma formação adequada: antes de tudo, à liberdade de filhos e filhas de Deus na sequela de Jesus Cristo, contemplado na oração e reconhecido nos pobres”, afirma o Documento em sua quinta parte (140-151). “Uma das solicitações que emergiram com maior força e de todos os lados ao longo do processo sinodal é que a formação seja integral, contínua e compartilhada” (143). Também nesse campo retorna a urgência da “troca de dons entre vocações diferentes (comunhão), sob a perspectiva de um serviço a ser prestado (missão) e em um estilo de envolvimento e de educação à corresponsabilidade diferenciada (participação)” (147). E “um outro âmbito de grande relevância é a promoção em todos os ambientes eclesiais de uma cultura de proteção (safeguarding), para tornar as comunidades lugares cada vez mais seguros para os menores e as pessoas vulneráveis” (150). Finalmente, “também os temas da doutrina social da Igreja, do compromisso pela paz e justiça, do cuidado da casa comum e do diálogo intercultural e inter-religioso devem ter maior difusão no Povo de Deus” (151).  

Entrega a Maria

“Vivendo o processo sinodal – é a conclusão do Documento (154) – tomamos nova consciência de que a salvação a ser recebida e anunciada passa pelas relações. Vive-se e testemunha-se juntas. A história nos aparece tragicamente marcada pela guerra, pela rivalidade pelo poder, por mil injustiças e opressões. Contudo, sabemos que o Espírito colocou no coração de cada ser humano um desejo profundo e silencioso de relações autênticas e de laços verdadeiros. A própria criação fala de unidade e de compartilhamento, de variedade e interligação entre diferentes formas de vida.” O texto se conclui com a oração à Virgem Maria pela entrega “dos resultados deste Sínodo: ‘Ensina-nos a ser um Povo de discípulos missionários que caminham juntos: uma Igreja sinodal’” (155).

O Papa aos siro-malankar: sinodalidade e ecumenismo são inseparáveis




 Francisco recebeu pela primeira vez, no Vaticano, o Santo Sínodo da Igreja herdeira das tradições siríacas dos cristãos de São Tomé e da reformada: "Devemos caminhar juntos, rezar juntos e trabalhar juntos". "Espero que um dia se possa celebrar um Sínodo ecumênico sobre a evangelização, todos juntos", disse o Papa.

Mariangela Jaguraba - Vatican News

O Papa Francisco recebeu em audiência, no Vaticano, nesta segunda-feira (11/11), os membros do Santo Sínodo da Igreja Siro-Malankar Mar Thoma que visita a Igreja de Roma pel"Este é certamente um dia de alegria na longa história das nossas Igrejas", disse Francisco no início de seu discurso. A seguir, Francisco deu as boas-vindas aos membros do Santo Sínodo, pedindo-lhes para que transmitam seus melhores votos de boa saúde ao seu Metropolita, Sua Beatitude Theodosius Mar Thoma, estendendo também sua saudação a todos os fiéis.

Vocação ecumênica

"A sua Igreja, herdeira tanto da tradição siríaca dos cristãos de São Tomé quanto da tradição reformada, se define justamente como uma “Igreja ponte” entre o Oriente e Ocidente", disse o Papa, ressaltando que "a Igreja Mar Thoma tem uma vocação ecumênica, e não é por acaso que se envolveu desde cedo no movimento ecumênico, estabelecendo muitos e vários contatos bilaterais com cristãos de diferentes tradições". O Pontífice lembrou que "os primeiros encontros com a Igreja de Roma foram retomados na época do Concílio Vaticano II, no qual Sua Graça Philipose Mar Chrysostom participou como observador. "É a abordagem dos pequenos passos que são dados", acrescentou o Papa.

Nos últimos anos, a Providência permitiu o desenvolvimento de novas relações entre as nossas Igrejas. Lembro-me em particular de quando em novembro de 2022 tive a alegria de recebê-lo, caro Metropolita Barnabé. Estes nossos contatos levaram ao início de um diálogo oficial: o primeiro encontro realizou-se em dezembro passado, em Kerala, e o próximo se realizará dentro de algumas semanas.

“Alegro-me com o início deste diálogo, que confio ao Espírito Santo e que espero que apresse o dia em que poderemos partilhar a mesma Eucaristia, cumprindo a profecia do Senhor: "Muitos virão do Oriente e do Ocidente, e sentarão à mesa”.”

Neste caminho de diálogo, o Papa destacou duas perspectivas: sinodalidade e missão.

Com relação à sinodalidade, Francisco ressaltou o fato de a Igreja Siro-Malankar Mar Thoma "fazer esta visita como Santo Sínodo", pois ela "é, por tradição, essencialmente sinodal". "Como vocês sabem, há poucos dias a Igreja Católica concluiu um Sínodo sobre a sinodalidade, no qual participaram também delegados fraternos de outras tradições cristãs que enriqueceram as nossas reflexões", ressaltou o Papa. "Uma das convicções expressas foi a de que a sinodalidade é inseparável do ecumenismo, porque ambos se baseiam no único Batismo que recebemos, no sensus fidei em que todos os cristãos participam em virtude do próprio Batismo", sublinhou.

Caminho de sinodalidade ecumênica

Segundo o Papa, o Documento Final do Sínodo sobre a Sinodalidade "afirma que não devemos apenas «prestar mais atenção às práticas sinodais dos nossos parceiros ecumênicos, tanto no Oriente quanto no Ocidente», mas também «imaginar práticas sinodais ecumênicas, incluindo formas de consulta e discernimento sobre questões de interesse comum e urgente»".

“Tenho certeza de que sua Igreja pode nos ajudar neste caminho de sinodalidade ecumênica.”

Lembro-me do que o grande Zizioulas disse sobre a unidade cristã. Era um grande homem, aquele homem; homem de Deus. Ele disse: “Conheço bem a data do encontro total, da união total entre as Igrejas”. Qual é a data? “No dia seguinte ao Juízo Final”, disse Zizioulas, “mas, enquanto isso, devemos caminhar juntos, rezar juntos e trabalhar juntos”. Todos juntos. Todos juntos.

Um Sínodo ecumênico sobre a evangelização

A seguir, o Papa passou à segunda perspectiva: a missão. "A sinodalidade e o ecumenismo são inseparáveis também porque ambos têm como objetivo um melhor testemunho dos cristãos. No entanto, a missão não é apenas o fim do caminho ecumênico, é também o meio", sublinhou.

“Estou convencido de que trabalhar juntos para testemunhar o Cristo Ressuscitado é a melhor maneira de nos aproximar. É por isso que, como propôs o nosso recente Sínodo, espero que um dia se possa celebrar um Sínodo ecumênico sobre a evangelização, todos juntos.”

Papa: Acutis e Frassati serão santos no Jubileu. No Vaticano, evento sobre direitos das crianças




 Francisco, ao final da Audiência Geral, anunciou a canonização dos dois jovens leigos em 2025: Acutis no Jubileu das Crianças e dos Adolescentes, Frassati no Jubileu dos Jovens. O Pontífice também divulgou que, em 3 de fevereiro, será realizado no Vaticano um Encontro Mundial dos Direitos das Crianças: “uma oportunidade para identificar novas maneiras de ajudar, proteger milhões de menores explorados, abusados e que sofrem as consequências dramáticas das guerras”.

Salvatore Cernuzio - Vatican News

millennial e o estudante, ambos serão santos durante o Jubileu. Carlo Acutis e Pier Giorgio Frassati, modelos e pontos de referência para a fé de milhares de jovens em todo o mundo, serão canonizados no próximo ano: Acutis no Jubileu dos Adolescentes, que será realizado de 25 a 27 de abril; Frassati no Jubileu dos Jovens, de 28 de julho a 3 de agosto.

O Papa anunciou a novidade na manhã desta quarta-feira (20/11) ao final da Audiência Geral, provocando aplausos na Praça de São Pedro, repleta de milhares de fiéis abrigados sob guarda-chuvas. Entre eles, também algumas crianças do comitê organizador de um grande evento que será promovido no Vaticano em 3 de fevereiro: o Encontro Mundial sobre os Direitos das Crianças, intitulado “Vamos amá-las e protegê-las”, que contará com a participação de especialistas e personalidades de diferentes países. A iniciativa também foi anunciada por Francisco no final da audiência deste 20 de novembro, Dia Universal dos Direitos da Criança instituído pela ONU. Outra notícia, fora do programa, que também foi recebida com forte aplauso e por um convite do Papa para um grupo de crianças se juntar a ele para cumprimentos e fotos. Francisco acrescentou:

Será uma oportunidade para encontrar novas maneiras para ajudar, proteger milhões de crianças que ainda não têm direitos, que vivem em condições precárias, são exploradas e abusadas e sofrem as consequências dramáticas das guerras.

Um evento no Vaticano pelos direitos das crianças

“Há um grupo de crianças que está preparando esse dia. Obrigado a todos vocês que estão fazendo isso!”, disse o Papa, apontando para o pequeno grupo de meninos e meninas usando bonés amarelos e carregando o cartaz ‘Ruoti per la Pace’, acompanhados pelo Padre Enzo Fortunato e Aldo Cagnoli, ambos organizadores da famosa JMC, a primeira Jornada Mundial das Crianças realizada em maio no Estádio Olímpico de Roma.

Imediatamente após as palavras do Papa, uma menina correu primeiro em direção aos degraus da Basílica: “e vocês podem ver que há uma corajosa...”, sorriu Francisco. “Agora vêm todos!”, exclamou ela ao ver todo o grupo correndo em direção a ele para agradecê-lo, em nome de todas as crianças, pela importante iniciativa que, além da JMC, de alguma forma dá continuidade ao compromisso da Cúpula de 2019 sobre a Proteção de Menores no Vaticano.

As canonizações

O pequeno Francisco (“Você se chama como eu!”, exclamou o Papa) e todos os outros apertaram a mão do Pontífice e tiraram uma foto juntos. Logo depois, Jorge Mario Bergoglio, ainda pensando nos pequenos, fez o anúncio das duas canonizações:

“Quero dizer que no próximo ano, no Jubileu dos Adolescentes, canonizarei o Beato Carlo Acutis e, no Jubileu dos Jovens, no próximo ano, canonizarei o Beato Pier Giorgio Frassati.”

Dois “jovens” santos

Em 23 de maio, o Papa Francisco aprovou o decreto para a canonização de Carlo Acutis, o jovem leigo apaixonado pela Eucaristia e pela tecnologia da informação, descrito por muitos como “um influencer da santidade”. No Consistório ordinário de 1º de julho, ele havia anunciado que seria elevado às honras dos altares “em uma data a ser determinada”. O bispo de Assis, Domenico Sorrentino, havia antecipado nos últimos meses que a Providência, disse o bispo, "queria que a proclamação de sua santidade, a ’canonização', ocorresse no ano jubilar que começará dentro de alguns meses”.

Frassati, um jovem estudante de Turim, terciário dominicano e membro dos Vicentinos, da Fuci e da Ação Católica, é um dos beatos mais conhecidos entre as novas gerações de católicos, considerado um dos santos “sociais” da Itália. Membro de uma família rica, dedicado à oração e aos frágeis, era também um bom esportista: “um alpinista... sagaz”, chamou-o João Paulo II, que quis beatificar esse “menino das oito Bem-aventuranças” em 1990. Agora, outro Pontífice, de origem piemontesa, o eleva às honras dos altares em um ano dedicado a recuperar a esperança. Aquela que tanto Acutis quanto Frassati pregaram, não com palavras, mas com suas vidas.

Equipe de Reflexão de Música Litúrgica continua trabalho sobre melodias, orações e cantos para a celebração eucarística

 



Aconteceu, de 15 a 17 de novembro, mais uma reunião de parte da Equipe de Reflexão de Música Litúrgica da CNBB, no seminário diocesano de Guarulhos (SP). A equipe continua o seu trabalho sobre as melodias para a celebração eucarística, orações eucarísticas e outros cantos do diálogo entre a presidência e a assembleia.

Padre Jair Costa, assessor da música da Comissão Episcopal para a Liturgia, ressalta a riqueza do trabalho realizado.

“A equipe recuperou belas composições para as orações eucarísticas e para os diálogos entre presidência e assembleia, muito adequadas para a liturgia, visando facilitar a participação da assembleia celebrante através do canto. Com as melodias selecionadas, entende que esta participação será em grande parte facilitada”, disse.

Padre José Carlos Sala, de Erechim (RS), membro da equipe de reflexão, expressa a grande alegria de participar deste grupo, que dá continuidade à linda caminhada da música litúrgica do Brasil.

“No período pós conciliar, o processo de inculturação da música aconteceu de forma muito intensa na caminhada da Igreja no Brasil, e o material agora compilado será muito útil para os padres que presidem, a partir da tradução do novo missal. Especialmente para as orações eucarísticas, haverá duas melodias para cada uma, numa riqueza que será muito útil para a vida litúrgica da Igreja no Brasil”.

Daniela Santos, leiga de Itumbiara (GO) e membro da equipe de reflexão, destaca a produtividade do encontro, que fez a revisão de todo o material composto sobre o texto do missal anterior, e agora transcrito com o texto da atual terceira edição do missal romano, com os ajustes necessários às melodias.

“Para as lacunas existentes, novas melodias foram criadas, visando valorizar os aspectos característicos da música brasileira, adaptando-a à liturgia”.

Na reunião, a equipe apontou inúmeros ajustes, para facilitar a fluência da música unida ao texto. E cada membro continuará o minucioso trabalho de revisar as partituras, conforme os apontamentos da reunião.

sexta-feira, 26 de maio de 2023

A pedagogia da cruz e o anúncio da Graça





 Pelo Domingo de Ramos da Paixão Senhor, nós, queridos irmãos cursilhistas, entramos na Semana Maior da nossa vida espiritual. Assim era chamada a Semana Santa no início da Igreja. E hoje entendemos isso porque em todas as missas ao longo do ano seremos sempre inclinados a vivenciar novamente e atualizar os mistérios de Jesus que nessa semana se vive de forma intensa.

É dessa semana, por exemplo, que são consagrados os Santos Óleos que ungirão novos cristãos pelo Sacramento do Batismo, confirmarão na fé os cristãos pelo Sacramento do Crisma, ordenarão novos membros da Igreja pelo Sacramento da Ordem, e ungirão os doentes pelo Sacramento da Unção dos Enfermos. De fato, é nessa Semana que vivenciamos a centralidade da nossa fé, enquanto Católicos Apostólicos Romanos.

Para muitos, vivenciar essa Semana é se recordar do sofrimento e da dor de Jesus. Mas nesse artigo, venho dizer que, na realidade, o que nós devemos nos recordar é da vida e da transformação de uma realidade que se via sem luz, em trevas e escuridão.

Antes de tudo, gostaria de dividir nossa reflexão em três partes. São elas:

  • A cruz não é apenas uma lembrança de dor;
  • A cruz sem Cristo e Cristo sem cruz não faz menor sentido;
  • A cruz como anúncio do encontro com a Graça.

A cruz não é apenas uma lembrança de dor

Vale recordar que a cruz, na época de Jesus, era um sinal tremendo de castigo e dor. A cruz era a pior condenação que uma pessoa poderia ter. Era uma forma de mostrar o quão vergonhoso era fazer o que aquelas pessoas que morriam na cruz faziam.

E mesmo sendo a pior de todos, Jesus aceitou essa condição humano. Como estava escrito na 2ª leitura (Fl 2,6-8) desse Domingo de Ramos:

[…] Jesus Cristo, existindo em condição divina, não fez do ser igual a Deus uma usurpação, mas ele esvaziou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo e tornando-se igual aos homens. Encontrado com aspecto humano, humilhou-se a si mesmo, fazendo-se obediente até a morte, e morte de cruz.”

No entanto, o que era vergonhoso e condenatório,  se tornou um sinal de abundância. Tornou-se Páscoa. Torno-se Graça. Tornou-se vida divina.

Flor de Maracujá

E sobre esse paradoxo de vida e morte, trago uma antiga lenda da origem da flor de maracujá. Entenda que essa lenda serve apenas para enriquecer nossa reflexão a cerca desse paradoxo.

Significado da Flor de Maracujá (O que é, Conceito e Definição) - Significados

Passiflora Incarnata é o nome em latim dessa flor que em português significa flor da paixão. E diz essa antiga lenda que nos pés da cruz a qual Jesus morreu, havia algumas flores que brotaram após seu sangue ser derramado sobre o madeiro seco e sem vida. Entre elas estava a flor do maracujá; razão pela qual, segundo a lenda, é roxa, simbolizando a paixão de Cristo.

É bonito perceber que onde existe secura, envelhecimento e desgraça (falta da Graça de Deus) pode existir vida pelo sangue de Jesus. E é Ele quem nos pede, nessa Semana Santa, a juntar nossas cruzes à Dele para que juntas elas possam dar vida.

A cruz sem Cristo e Cristo sem cruz não faz menor sentido

Nosso Carisma nos ensina que o Cristo que devemos nos recordar é o Cristo vitorioso, que após a sua morte, ressuscitou e foi ter com os seus no ambiente em quem sempre estavam reunidos. O MCC nos ensina isso, não porque devendo apagar o sofrimento de Jesus e apenas nos recordar das coisas satisfatórias. Pelo contrário, queremos nos lembrar da sua Paixão pela sua Ressurreição. Queremos olhar para a cruz e enxergar vida, saída, vitória e Graça.

No entanto, queridos irmãos, a Cruz sem Cristo é apenas um madeiro sem vida, e Cristo sem Cruz é apenas um mito. Entenda que nunca foi dito por Jesus que ele não teria que passar pela dor. Até mesmo São Pedro tentou se esquivar dessa missão de Jesus. Mas como relata Mateus 16,23, Jesus o repreendeu.

“Logo depois, Jesus falou sobre sua própria morte e Pedro o repreendeu. A resposta de Jesus foi áspera: “Arreda, Satanás! Tu és para mim pedra de tropeço, porque não cogitas das coisas de Deus, e sim das homens” 

Paixão é uma palavra que vem do grego Páthos e significa sentimento de dor, compaixão ou empatia. Aristóteles , filósofo da Grécia Antiga, define a paixão (páthos) como o que move, o que impulsiona o homem para a ação. Perceba que a vida de Jesus e sua paixão são inseparáveis, visto que o que lhe impulsionava era a missão de salvar a todos. Mesmo sabendo que era preciso sofrer, sentir dor, agoniar-se. A sua paixão era o que o movia, logo é impossível pensar em Jesus sem nos lembrar de sua dor, de seu sofrimento, de sua morte.

Veja que Deus não nos criou para o sofrimento. Ele nos deu o paraíso por Adão e Eva. No paraíso existia tudo o que o homem precisava. Mas por concupiscência e avareza de Adão e Eva, ambos foram expulsos. No entando,foi em Jesus que recuperamos, por Graça de Deus, a entrada para o paraíso.

Quando Jesus ressuscitou e Maria Madalena foi até o sepulcro onde Ele estava ( Mateus 28,14-16), recorde-se que ela olhou para Jesus achando que era um jardineiro.

Então reparou que alguém estava atrás de si. Era Jesus, mas não o reconheceu.“Porque choras?”, perguntou ele. “Quem procuras?” Ela pensava que fosse o jardineiro: “Se foste tu que o levaste, mostra-me onde o puseste que eu vou buscá-lo.”“Maria!”, disse Jesus. Ela voltou-se para ele: “Raboni!”, que quer dizer: “Meu Mestre!”

Essa visão de Maria Madalena não foi uma confusão, mas uma promessa feita pelos antecessores de Jesus, os quais o anunciavam como o Messias, o Salvador, o Cristo. Jesus nos devolveu o Paraíso por amor e compaixão. É em Jesus, o novo Adão, que todas as coisas se recriaram. Foi pela sua morte que a vida ganhou um novo sentido.

A cruz como anúncio do encontro com a Graça

Por fim, querido cursilhista, vamos refletir a cerca da cruz como anúncio do encontro com a Graça.

Para exemplificar isso, trago uma pintura de São Bernardo de Claraval, abade francês do século XI, o qual teve uma visão. Aparentemente, pode parecer nessa pintura que São Bernardo o pega pelo braço como uma criança que necessita de cuidado.  Mas na realidade, era Jesus que descendo da Cruz vai ao seu encontro para abraçá-lo.

Um abraço à divindade: São Bernardo de Claraval | Tendências do imaginário

E essa pintura é o que nós cursihistas somos chamados a  vivenciar em nossa espiritualidade. O Cristo que nos abraça no alto da Cruz nos convida a ressuscitar com Ele, a vivenciarmos sua Páscoa com Ele.  É na sua cruz que o encontro com a Graça acontece.

Recentemente conduzi uma escola vivencial a qual eu contei minha experiência aos presentes. Refleti a cerca do meu Cursilho, o 2º tempo do método. Levei-os a fazer uma relação entre os dias antes de eu entrar na casa para realizar o Cursilho, os dias que estive na casa para realizá-lo e o meu 4º dia, após minha saída da casa.

Com isso, conclui com eles que os dias em que se antecederam o meu Cursilho foram os dias de paixão, dor e sofrimento. E ao entrar na casa para realizar o Cursilho, ao me encontrar com a Graça de Deus,  me deparei com a ressurreição.

Para mim, o meu Cursilho foi como essa pintura de São Bernardo. Recebi de Jesus, no alto da Cruz, um abraço. E esse abraço foi o momento em que eu ressuscitei nele e Ele ressuscitou em mim.

O Cursilho foi para mim uma Ressurreição. Após entender o sentido real da vida, pude rolar as pedras que não me deixavam enxergar a luz de Cristo. E assim, o Cursilho também pode significar um momento de ressureição para muitos.

Conclusão

Caro cursilhista, concluo esse artigo te convidando a viver essa Semana, a qual damos o adjetivo de Santa, entregando-se inteiramente aos mistérios de Jesus. Deixe ser amado por Ele. Deixe ser abraçado por Ele.

Santo Inácio de Loyola nos ensina em seus exercícios espirituais a viver os mistérios de Cristo com bom ânimo e generosidade. Seja generoso com o chamado de Jesus e tenha ânimo para fazer o seu percurso do calvário ao momento da sua ressurreição.

Postagens mais antigas → Página inicial